sexta-feira, 25 de setembro de 2009

whisky e Gin



Entre whisky e Gin, os dois trocam todo o tipo de olhares tímidos e discretos entre si.

“ - Mais um whisky com duas pedras de gelo.”
Era necessário fazer tempo até ganhar coragem e ir ao encontro dela, como num filme qualquer onde o homem confiante, forte, atraente e de cigarro na boca tinha como objetivo “caçar” a primeira mulher que tivesse um rótulo estampado no olhar com as seguintes indicações: carente, financeiramente abastada, necessitada de noites escaldantes com orgasmos gritantes, facilmente descartável, ingênua e minimamente aceitável fisicamente. Este romance é outro gênero com contornos mais próximos do drama ou da tragédia. O homem não é um herói e a mulher não é ingênua
(se bem que precisa daquelas noites em que a respiração faltava-lhe vez em quando)
suficiente para cair numa armadilha tão manhosa com um trago de sensualidade à mistura (ela sabia que ele jamais seria suficientemente capaz de tal. Por quê?).
Os copos amontoam-se no balcão do bar e, ao de longe, ela o vê aproximar-se em passos largos para a decadência total. Sente-se, em parte, culpada pelo momento que ele atravessa mas sabe que não podia iludir-se mais; que um recomeço entre eles seria exigir um empenho descomedido e que nada seria como no inicio pois a sensação de pureza e de simplicidade que morrera no ápice em que o seu segredo fora desvendado no mar de lágrimas salgadas que ela resistira a limpar-lhe. Deixou-o esgotar-se e torturou-o com o seu silêncio.
arrependida?
No meio de tanto banzé, tacadas vindas da mesa de snooker, homens e mulheres que se confidenciam e gladiam-se com os argumentos necessários para acabarem num motel qualquer a fim de terem sexo, entre risos crônicos e cínicos aqueles dois não param de pensar no passado; no dia em que as duas almas se converteram em uma só .
Olha para ti e vê no que te tornaste: ela voltou a se descobrir, largou os lençóis com o teu cheiro, fez a cama, sorriu ao mundo, pintara-se com o estojo que lhe ofereceste no terceiro mês de união e escolhera o lápis de cor azul
(Aquele que tanto gostava que ela usasse)
marinho e retocara os olhos, perdera o medo de encarar o mundo, saiu do triste lar em busca de algo que desconhecia mas que a poderia ajudar a enfrentar a dor. Ele encarara que tinha caído, que falhara redondamente, que não estava preparado para amar aquela mulher. Bebia de manhã, à tarde, quando tinha sede, quando não a tinha… Lamentava-se a todo o instante por não ter amado exaustivamente a mulher que aprendeu a admirar e a respeitar
(e a amar?)
na sua ausência. Perdera os botões de punho que ela dera-lhe enquanto não tinha entendido que o amor tem limites e tornara-se obcecado com os poucos momentos de felicidade em comum.

Largas uma lágrima que foge apressadamente para um qualquer canto do teu corpo onde se possa esconder da tua vergonha, felizmente não vai para os copos de whisky que se vão amontoando no balcão como cabras no pasto. Só de saber que foste minha um dia e te perdi para todo o sempre…
“ - Outro whisky, por favor.”
Diz ele, que se debruça esperando escutar uma voz oriunda da madeira do balcão ou do interior dos copos vazios e
“ -Terei eu me apaixonado por alguém que realmente não existe; que foi criada pela minha expectativa? A culpa não é tua… Ninguém é dono de tudo e de todos.)
continua a refletir, aparentemente, sobre nada. No meu consciente , ainda ecoa aquela frase dita por uma menina. Já não tem corpo nem espírito; foram retirados numa noite de lua cheia. Tiraram-lhe tudo e agora agarra-se à “alma”, aquela que mais de metade da população mundial não sabe o que significa, mais uma das muitas perguntas sem resposta…
Não sei se tive amor ou apego por ti mas, a verdade é que de tanto te desejar, perdi-te para sempre e nada mais me resta. Aí esta você, sem querer mostrar-me a cara. Reparei nos tons azuis que estão nos olhos e pergunto-me se usaste aquela cor que tanto amava… Se é a minha cor ou não, já não sei responder, quero acreditar que é meu. Apenas quero “voar como o vento.
(ainda lembra quem te disse isto?)
Como aquela menina que era independente de tudo, de todos, do mundo. Saudade da infância perdida, onde as pinturas eram as mais puras e belas… Crescer fez-me ver um universo funcional a três dimensões, com pormenores assustadores e detalhes (excessivamente) duvidosos. Perguntei-lhe um dia, se a vida não se baseava num sentimento de inquietude com uma mistura de falsas expectativas e um trago de sonhos irrealizáveis.
Mais um whisky por Favor?
Não me lembro se chegaste a responder
(chegaste?)
Porque os meus olhos a muito que já se tinham perdido nos contornos do teu cabelo loiro, as mãos afagando as linhas finas que te davam a mais belas das cores ao teu cabelo
(ou ainda eras morena?)
Sedoso e macio. Tal como tu, em todas as tuas expressões mesmo nos momentos mais aflitivos eras branda e suave demais. As tuas mãos irradiavam tranqüilidade em cada gesto que expelias do teu interior. Ouve as minhas preces e volta para mim, entrega-te novamente e deixa-te voar
(como a pequena menina)
Nos meus braços até encontrares um caminho que te leve aos meus lábios embriagados e secos de ti.
Ali está ele, certamente a lamentar-se do pouco tempo que viveu com ela e de tanto que ficou por provar. Impávido e sereno olha para os copos como se estivesse a estabelecer uma conversa telepática com o liquido já evaporado. Ela contempla qualquer coisa, mas, sem nunca desviar a atenção do balcão. Não sei se ela tem prazer em apreciar aquele traste ou se está à espera de um sinal dele para avançar. Pintara-o um dia, com muita relutância dele, numa tela gigantesca onde talvez quisesse expressar o seu amor, por ele, num espaço tão amplo. Não seria demais? Pegara num fino pincel e começara a traçar-lhe as curvas do rosto impávido e (ainda) sensual. Lá fora, à noite e a lua cheia teimavam em espreitar pela janela a obra que ela estava a criar. Enquanto desenhara, dissera-lhe que “todas as críticas sobre uma obra de um artista são positivas, o pior é quando a obra não desperta sentimentos nas pessoas e as deixa na total indiferença”. Não sei se ele ouvira o que aquela mulher tão inteligente afirmara, mas, a pintura lá continuou noite dentro até a última pincelada.
Onde é que estará aquele quadro que pintei? Aquele em que mostrei ao mundo como tu, verdadeiramente, eras? Aquela pintura que teimaste que não fosse concretizada? Tinhas vergonha de te revelar? Por quê? Dentro de ti, estava a pessoa mais bela, carinhosa e sensual que alguma vez me tocara… Nunca vira um pincel com tanta avidez de pintar o que quer que fosse,
(ou seria a minha mão?)
Ele sentira-te e um enorme desejo de gravar na tela uma daquelas fotografias de alguém que amamos muito e anda sempre conosco. Tenho saudades de te pintar.
Tua vez!
Diga-me?
Que pintar o meu rosto, o meu perfil, o perfume escondido nos olhares que lançavas sobre a paisagem da janela. Não percebia se olhavas para a lua ou para a viúva da luz acesa mas a verdade é que isso não te interessava, gostava de me ver assim, tão personalizado, tão austero e delicado ao mesmo tempo. Poderia eu voltar a ser o seu amante, o seu amor? Começarias eu tudo outra vez? Reacenderias a chama do teu peito? Colarias teu corpo ao meu? Voltaria a dançar no salão de prata, iluminado pela luz das velas, ao som daquela orquestra afinada? Ergue-te na madrugada e lança as tuas asas, cobrindo este corpo áspero da saudade, e voa com a eterna sonhadora. Por mais cores que junte não te sinto aqui…
Não me tragas o passado nem as lembranças, as expectativas defraudadas e o que ficou por concretizar.Vivas nesse teu mundo inconstante
(ainda mais do que o meu e com a ajuda destes copos)
e vá seguir o teu desstino. Quero partilhar o meu coração, aquele que foi teu, e que viveu dentro de ti por um instante. Adianta tentar esquecer-te? Consigo, e quero, vive e renasce no meu interior com todos os meus pequeninos detalhes, recriei-me e , lembra-te de mim, como uma fotografia pregada à parede.
Iluminando as paredes que ouvem o choro de um grande amor. Lembras-te de mim? Ainda sabes o meu nome? Ainda vivo sem ti? Perdi o teu carinho num dos muitos baús lá de casa. Não sei onde o guardei, talvez se tenha dissipado no pó da noite sem luar. Ainda me vês? Alcanças-me? Desejas-me? Voltarás para casa, desencantada da vida e do sonho. E se tivesse alguém que me quisesse bem… Desisto desta busca? Ou espero pela Primavera por um sinal? Que jeito tão estúpido de ser. Tão vazia a alma, a voz.
Declaro que antes de me deixar levar pelas ondas da bebida fui até ao mar conversar sobre tudo e nada, sobre a vida que agora eu sei e que jamais te encontrarei totalmente nas memórias. Foste mais que uma utopia, uma visão de um rude viajante que se negava a dizer não. E agora que vamos beber? Resta-me afogar-te numa morte rápida e sem amargura. Vou tentar, desta vez, não me atirar do barco voar como um herói ou galanteador de mulheres. Achei, sem dúvida, o grande amor da minha vida…

Fim

0 comentários:

Postar um comentário